quarta-feira, 13 de outubro de 2010

RESUMO: ÉDIPO E GÊNERO (FRANKLIN GOLDGRUB)

2ª Unidade – Parte 4: Édipo e gênero (Franklin Goldgrub)

Édipo e gênero

O complexo de Édipo iniciou-se quando Freud revogou a teoria do trauma/sedução, a qual afirmava ser a neurose conseqüência de traumas de natureza sexual sofridos na infância, recalcados e revividos em forma de sintomas.
- Essa teoria foi revogada quando Freud constatou que os relatos de suas pacientes eram fantasias inconscientes.
- Por outro lado constatou que os abusos efetivamente consumados não resultavam necessariamente em distúrbios neuróticos ou perversos.
-Assim como o comprometimento da afetividade e da sexualidade podiam manifestar-se no adulto sem qualquer origem traumática na infância.
A descoberta das fantasias propiciou a construção do conceito de Édipo e o reconhecimento da importância das fantasias sexuais infantis.
A função inicial do Complexo de Édipo era a de descrever o processo de formação da identidade sexual, assim como os conflitos decorrentes da ligação entre a criança e as figuras parentais.
Nesta primeira versão do Édipo, Freud formulou o conceito de identificação que progressivamente substituiu os fatores biológicos e ambientais na explicação dos conflitos psíquicos.
A identificação é o processo de assemelhar-se a modelos adultos - tendo em vista a presença do casal parental - a partir de uma constituição indiferenciada (bi-sexual).
Resultando em:
- Construção da auto-imagem de gênero (feminino e masculino).
o Identificação com o progenitor do mesmo sexo.
- Construção das características do objeto a ser desejado
o Identificado com o objeto proibido.
A homossexualidade não era pensada até então a partir da situação edipiana, a qual descrevia até o momento as formações neuróticas e perversas.
- A neurose resultaria da dificuldade de abandonar a escolha objetal feita na vivência familiar.
- A perversão resultaria da permanência do padrão infantil de relacionamento.
A dissolução do Complexo de Édipo levaria a normalidade e a não dissolução implicaria em comportamentos neuróticos e perversos.
Ainda neste contexto a sexualidade infantil aparece limitada à fase oral, anal e a aspectos auto-eróticos.
No entanto em 1924 a fase fálica (transformação do auto-erotismo em relação objetal e perversidade polimorfa em primazia do falo. O termo falo designa o aspecto imaginário do pênis na fantasia infantil, que concebe a condição masculina adulta como privilegiada, pois detentora do amor materno. ) é relacionada ao Complexo de Édipo e se torna sua referência central, dando-lhe característica atemporal, ou seja, estrutural, e, portanto sua permanência vitalícia; até então o Édipo, por estar relacionado às vivências reais da criança era “empírico”.
A análise do pequeno Hans e o imaginário infantil com qual Freud se defrontou, possibilitou a conceituação da fase fálica, do complexo de castração e da inveja do pênis, os quais abriram caminho para uma teoria do desejo desvinculada (não completamente) de fatores ambientais ou determinantes orgânicos, no entanto, Freud ainda relacionou as “consequências psíquicas” do Complexo de Édipo as “diferenças anatômicas” sempre mantendo em sua teoria alguma explicação biológica e desta forma priorizando a causa em relação ao sentido.
Segundo Franklin Goldgrub:
“A psicanálise permanece fraturada entre a metodologia interpretativa e a teoria presa à problemática etiológica. No terreno teórico, a “realidade material” mantém-se hegemônica. A linguagem, “sede” do sentido, ou seja, da “realidade psíquica”, exerce uma soberania inconteste no consultório e simultaneamente ocupa um papel meramente secundário em terreno teórico-epistemológico”.
Nos textos “Algumas consequências psíquicas das diferenças anatômicas entre os sexos” (1925) e “A dissolução do complexo de Édipo” (1924), Freud reformula e desenvolve alguns conceitos:

- Revogação da simetria das vivências afetivas das meninas e meninos.
- Órgão masculino passa a ser valorizado.
- Órgão feminino permanece desconhecido (ideia de falta e deficiência).

- figura paterna obstaculiza o acesso ao amor incondicional.
o No menino como rival temido.
o Na menina resistindo a sua sedução.
- Superego.
o No menino é severo.
o Na menina não alcança o poder necessário do ponto de vista cultural.
O complexo de castração:
Complexo centrado na fantasia de castração atribuída à ausência de pênis na menina.
“Algumas conseqüências psíquicas das diferenças anatômicas entre os sexos” (1925):
- Menina ingressa no Édipo ao aceitar a castração como castigo já efetivado.
- Muda de objeto de desejo e de região erótica (do clitóris para a vagina).
- Pai (novo objeto de desejo) nega-se à filha, mas oferece-lhe o modelo do homem de quem ela receberia o bebê fálico (indenização pela ausência do pênis).
-A mesma situação (castração feminina) é o motivo para a dissolução do complexo no menino.
- O rochedo da castração – impossibilidade de abandonar e de alcançar o objeto de desejo (incompletude).
- substituição da possibilidade de dissolução do Édipo por sua permanência; desejo de completude, estado impossível de ser alcançado.
Em “Feminilidade” (1933):
- As psicanalistas mulheres contribuem para a teoria do complexo de Édipo feminino.
- Fase pré-edipiana – menina tem forte ligação com a mãe (abertura para a explicação da homossexualidade feminina a partir do Édipo).
- A noção de “inveja do pênis” (1908) torna-se agora característica central do Édipo feminino, dela derivam três possibilidades:
o Inibição sexual ou frigidez (neurose).
o Homossexualidade.
o Heterossexualidade (implicando a maternidade, substituição do pênis pelo bebê).
A partir da inveja do pênis é elaborada uma descrição da mulher através da condição de “inferioridade genital”. Essa condição seria responsável na mulher por sua rigidez de caráter, falta de senso de justiça e menor capacidade de sublimação, que seriam em parte compensados através dos filhos homens, única alternativa capaz de propiciar a realização pessoal.
Essa postulação devesse à generalização de certas fantasias infantis, assim como a concepção de feminilidade preconceituosa da Viena do século XIX.
Em “Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade (1905).
- Uma forma de homossexualismo masculino seria a repulsa à vagina a adoção do objeto do mesmo sexo.
- A feminilização do homem se daria por identificação à mãe.
Segundo Franklin nos dois casos acima, respectivamente:
- Freud não contempla a homossexualização masculina caracterizada pela feminilidade.
- Não repensa essa ideia a luz da fantasia que outorga ao pênis a condição valorizada de falo.
Em “Feminilidade” (1933).
- As relações homossexuais femininas comportam o padrão do modelo heterossexual e também a adoção dos papéis de mãe e filha.
Para Franklin Goldgrub essa afirmação é incompatível a modalidade homossexual feminina não masculinizada, nem maternal.
Além disso, o autor do texto tece outras críticas relativas à valorização do pênis enquanto crença universal - fator que limita a teorização da homossexualidade - assinalando casos em que a primazia do falo não permanece atuante no psiquismo feminino e masculino como Freud postulou:
- Homens que assumem características femininas para sua cultura.
- Homossexualidade feminina que não reivindica a condição masculina ou a representação da mãe fálica.
- Cirurgias de extirpação do pênis.
- A não exclusividade ou acentuada predominância dos conflitos neuróticos e psicóticos em mulheres, sobretudo a depressão.
- A depressão caracterizada pela crueldade do superego não se aplicaria as mulheres, visto estas possuírem, segundo Freud, um superego complacente.
- O superego feminino indulgente não é compatível com as ideias de desvalorização do feminino expressas pela auto-aceitação ou autocrítica exacerbada, estas dependeriam de uma estrutura superegóica mais severa.
Feitas essas críticas surge a questão se a “inveja do pênis” e “medo da castração” podem ser consideradas fantasias universais. Se não forem, o que restaria da suposição que haveria um Édipo para cada gênero?
Função do Édipo:
- Explicar a construção da identidade de gênero?
- Explicar a constituição do sujeito para além do aspecto sexual?

As expectativas inconscientes e a identificação

A universalidade da crença fálica propiciou a generalização:
- Condição feminina à “inveja do pênis”.
- Condição masculina ao complexo de castração.
- Fantasia feminina (conseqüência da sua anatomia sexual).
- Fantasia masculina (conseqüência da sua anatomia sexual).
- Mãe ou figura feminina representação do amor incondicional.
- Pai ou figura masculina função normativa.

Segundo Franklin, quando se pensa o imaginário infantil a partir da perspectiva do sentido (derivação da linguagem) afasta-se das implicações empíricas, que não são capazes de abranger a totalidade das relações e ultrapassar as questões biológicas e as sociais de cada época.
Deste modo o autor aponta que nem todas as crianças têm:
- Uma figura masculina desempenhando uma função restritiva.
- Uma figura feminina enquanto representação do amor incondicional
- Configuração familiar tradicional.
Desse modo, as expectativas inconscientes singularizam cada existência humana e independem do gênero.
Nas “fantasias originárias” e nas “teorias sexuais infantis” (exceto a da sedução) é possível vislumbrar uma semântica que em princípio não diferencia a menina do menino e escapa as explicações empíricas privilegiando o sentido.

O Édipo estrutural

A noção de identificação no Édipo estrutural é entendida como a construção de um discurso desejante a partir dos lugares dispostos pelas expectativas inconscientes presentes nos adultos para os quais a criança constitui a realização de um projeto particular de vida. Disso decorre que:
- Cada criança (ainda que da mesma família) será objeto de expectativas inconscientes únicas.
- As expectativas inconscientes se expressam pela especificidade do discurso que promoveu o nascimento.
- Conflitos psíquicos de gênero podem ser entendidos pela predominância de expectativas inconscientes de desvalorização de gênero tanto feminino quanto masculino.
- O processo de constituição de identidade é independente de determinantes biológicos (anatomia e fisiologia sexuais) e culturais.
A noção de expectativas inconscientes traz a possibilidade de identificação com qualquer dos gêneros sem que haja necessariamente a presença física de ambos os sexos:
- Criança criada em num meio exclusivamente feminino pode formar identidade predominantemente masculina (quer se trate de menino ou menina).
- Criança criada numa família heterossexual pode formar identidade homossexual.
- Criança criada numa família homossexual pode formar identidade heterossexual.
A aquisição da linguagem pela criança a coloca frente à falta (desejo). O início do Édipo decorre dessa aquisição e se expressa pela recusa da falta (reconhecimento do desejo do outro).
Quando a criança alcança a posição desejante se instaura a condição humana de falta, a qual sua frustração de não poder ter tudo o que deseja não se justifica na menina pela “inveja do pênis” e no menino pela ameaça à castração.
A castração é uma operação simbólica sobre um objeto imaginário, o falo, efetuado por um campo normativo. A falta significada na castração é a interdição do incesto, a incompletude, a impossibilidade de alcançar o objeto de desejo.
O conflito no primeiro momento do Édipo não se caracteriza pela rivalidade decorrente da identidade sexual, mas pelo desejo de completude (expectativas inconscientes do campo desejante) e pela atitude oposta. Decorre que o ciúme infantil pode se expressar para qualquer um dos sujeitos do campo desejante, visto que, o amor incondicional pode ser representado por qualquer pessoa do campo desejante, independentemente do sexo.
- A predominância da fantasia fálica representa o conflito entre a completude e a falta e não a diferença entre masculino e feminino.
- A constatação da falta independe da diferença anatômica entre os sexos, mas ao contrário ela é conseqüência da constituição da falta.
- A posição desejante é o segundo momento do Édipo e ocorre paralelamente a construção da identidade sexual.
A valorização de um dos gêneros, a mútua valorização ou desvalorização depende do lugar que for dado à criança a partir das expectativas inconscientes expressas no discurso do campo desejante.

Outubro/2010 - Elaborado por Anna Miha da Equipe de Monitores de Psicanálise - PUC/SP – Campus Barueri.

2 comentários:

Maluk disse...

valeu monitora!! (em nome do grupo)

Maluk disse...

valeu monitora!! (em nome do grupo)